Quando se toma uma situação difícil por uma única perspectiva, restringem-se as possibilidades para que se encontre a melhor alternativa para enfrentá-la. Ao longo da vida, acumulam-se uma série de registros em nossas memórias, por conta de experiências e emoções marcantes pelas quais passamos. É natural que as pessoas se referenciem nessa base de dados para tomarem suas decisões. Como a cada pessoa corresponde uma distinta história de vida, além do fato de que, pessoas diferentes sentem emoções de modo distinto e reagem de modo diferenciado a um mesmo estímulo; não é de se surpreender que diante de uma mesma situação de perigo, uma pessoa fuja, correndo o mais rápido que puder, enquanto outra enrijeça os músculos e parta para a briga, com toda a energia do corpo e toda fé da alma.
Um fato a se destacar é que, desde a infância, aprendemos a pensar de modo binário, ou seja, oito ou oitenta; matar ou morrer, tudo ou nada, certo ou errado, ganhar ou perder, sim ou não, céu ou inferno e assim por diante. Por conta disso, desde bem cedo, nos induziram a crer que, em momentos de risco, há somente duas alternativas, ou esta ou aquela e a decisão deve ser tomada em nano segundos, por razões óbvias, já que algum tipo de integridade está em jogo. Mesmo que haja no universo centenas de possibilidades intermediárias, não fomos educados para vê-las. Filhos homens não devem chorar, nem levar desaforo pra casa. Se algo não funcionar devem tentar mais forte. Muitas vezes, por conta disso, quebram-se os controles remotos, antes de perceberem que foi a pilha que acabou, espana-se o parafuso de rosca esquerda e quebra-se a porta que abria para o outro lado.
Some-se a isso o fato de que, a maioria dos pais, tendo nos filhos o seu maior tesouro e cientes das tantas ameaças que o mundo lhes impõe, só se sentem seguros tendo seus descendentes ao alcance da vista. Não se lhes permitem tomar qualquer decisão autônoma, sem antes pedir permissão! O que resulta em perguntas do tipo: Mãe! Posso levar a Lulu pra dar uma volta lá fora? Posso ir soltar pipa com o Beto? Posso ligar a TV agora? Posso por a camisa que está no varal? Posso fazer a lição de casa depois? Posso pegar mais um bife? Por um certo tempo isso será possível, mantendo-os no cercadinho, no berço, no bebê conforto, no quarto ao lado ou à barra da saia ou da calça. Porém de um jeito ou de outro, chega um momento em que esse virtual cordão umbilical se arrebenta e a criança, o adolescente, o jovem, precisa se aventurar em carreira solo em direção a novos ares, terras e mares. O primeiro emprego, a faculdade em uma cidade distante, a primeira viagem o primeiro acampamento; daí que, embora egoísta, pais e, em especial, as mães, sentem o desejo insano de continuarem a manter algum tipo de controle, em favor da segurança de seus rebentos, ainda que estes já estejam, completamente, rebentados.
Em geral, tal manipulação virá por meio da imposição do medo, ou seja, pela extensão do bicho papão, que costumava ficar em cima do telhado, da cuca que vinha pegar enquanto o papai ia pra roça ou ainda do boi da cara preta. Porém, dado o adiantado da idade, o bicho, a cuca e o boi passam a ser incorporados por outros tipos de personagens, tais como as possíveis más companhias, as drogas, os vícios, as imprudências, as DSTs (Doenças Sexualmente Transmissíveis), a violência do trânsito, a gravidez precoce, os marginais, os ladrões, os malfeitores, etc. O controle costuma ser tão severo que repercute no comportamento da criança, do adolescente, do jovem e até do adulto, muitas vezes, ao longo de toda a vida. Que professor ainda não ouviu: Professor! Pode ser à lápis? Pode ser com caneta vermelha? Precisa copiar as perguntas? As respostas precisam ser na sequência?
De certo modo, os professores, que em sua maioria, também são pais, reforçam as restrições à criatividade, à inovação, à autonomia e ao auto controle; aceitando somente as respostas esperadas, ou seja, exatamente iguais ao manual do professor. Alunos questionadores são vistos com reservas. Dar aulas para alunos comportados e quietinhos rende mais e facilita o cumprimento da ementa. Há muita matéria para ser passada no período letivo e não há tempo para devaneios. No entanto, as inovações, muitas vezes, surgem exatamente nos devaneios! Em resumo, engessa-se muito a liberdade. Muito se fala, muito se ouve, muito se escreve, mas pouco se questiona, pouco se pensa, nada se filosofa e pouco se aplica.
Para alguém que foi criado para não fugir do padrão desde a infância, que se reforçou o comportamento conformista, que se garantiu a integridade por meio do medo, que se treinou e educou para pensar de modo binário e restrito, é muito natural que diante de situações difíceis só enxergue dois caminhos, a cruz ou a espada!
O que fazer então? Reveja seus paradigmas, reescreva suas certezas, reinvente-se, reeduque-se, recomece, faça de novo, comece de lá pra cá, parta do inverso, do meio, de baixo pra cima e de cima pra baixo e tenha a coragem de olhar um mesmo desafio por várias perspectivas. Permita-se enxergar o mundo não apenas pelos seus olhos, mas também pelos olhos do cliente, do chefe, do acionista, do servente, do subordinado, do usuário final, da diretoria, do professor, do aluno, do velho, do adulto, do jovem e, de um modo especial, pelos olhos das crianças, pois o olhar da criança, quase sempre, é o olhar de Deus.
Marcondes 13 de Abril de 2015 03:04
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